Título da palestra: O parlamentarismo como caminho para superar a crise política
Resumo:
A crise institucional brasileira possui diversas dimensões. A principal reside na confusão entre Estado, governo e administração, prática que acabou por falir o chamado presidencialismo de coalizão. O sistema eleitoral movimenta-se em um cenário hiperpartidário, incapaz de formar maiorias parlamentares necessárias à governabilidade. De fato, elege-se uma pessoa, denominada de Presidente da República, cujo partido não possui maioria nas Casas Legislativas para levar à frente seu programa de governo. Nesse obsoleto sistema, ou se compra apoio político majoritário ou não se governa. As costuras necessárias à obtenção de alianças dependem da distribuição de cargos e benesses, convertendo o espaço público em um balcão de negócios, onde as coalizões são um mero pretexto para obtenção de vantagens de todo o tipo, inclusive pessoais.
Não mais se trata de seguir uma linha ideológica, mas de manter a influência e receber a maior fatia do bolo. Para além da corrupção, o resultado é o desperdício pelo inchaço da máquina e a debilidade dos serviços públicos, considerando o critério empregado para a nomeação de funções de direção e chefia. O dilema institucional brasileiro repousa, portanto, na noção de que Estado, governo e administração são realidades que não se confundem. Órgãos de Estado não podem ser aparelhados como condição à governabilidade, assim como a administração não pode servir a interesses partidários, unidos por interesses de ocasião.
A solução da crise política depende, portanto, de uma drástica mudança no sistema de governo e, nesse sentido, passa pela adoção de um governo parlamentarista, enquanto sistema que privilegia a racionalidade e a funcionalidade. Isso porque o parlamentarismo parte da separação entre Estado e Governo, conferindo a chefia de governo ao político que possui apoio majoritário no Parlamento, deixando a Chefia de Estado a alguém com perfil de magistrado, moderador. A governabilidade flui com naturalidade, diminuindo o espaço para negociações espúrias. Trata-se de arranjo apto a combater o aparelhamento dos órgãos de Estado e da própria Administração, prática que, infelizmente, é o dia-a-dia da política nacional.
Outra grande vantagem é o fato de o chefe de governo não possuir a blindagem de um mandato, o que o torna politicamente irresponsável perante o parlamento. Ao contrário do presidencialismo, onde em situações normais um chefe de governo não pode ser destituído do cargo durante o mandato, ainda que cometa políticas errôneas, no parlamentarismo isso é uma consequência natural, o que inibe acomodações e frustrações. O presidencialismo nos impõe, em verdade, uma espécie de ditadura a prazo fixo, já que apenas nas hipóteses de crimes comuns ou de responsabilidade pode-se destituir o Presidente. O que se vê, é que no presidencialismo a troca de governante no curso do mandato depende de um cenário de crises constantes, provocadas por longos e traumáticos processos de impeachment, que paralisam a nação. Já no parlamentarismo, a substituição do chefe de governo é uma consequência natural do sistema, que não deixa maiores traumas, não cabendo espaço para o tão comum discurso de golpe, que acaba por dividir a nação, dificultando o surgimento de novas lideranças que podem nos conduzir a consensos mínimos.
Por fim, o parlamentarismo adapta-se ao chamado recall, sonho de consumo do eleitor indignado com a crise de representatividade brasileira. Isso porque o Chefe de Estado, figura supraideológica e suprapartidária, pode, na condição de Poder Moderador, dissolver o parlamento e convocar novas eleições, o que obriga os representantes a se manterem na linha. Junte-se essas vantagens com a adoção de um sistema eleitoral de voto distrital com cláusula de barreira, de modo a racionalizar a política como um todo, diminuindo a influência das corporações, o número de partidos e o custo das campanhas, favorecendo a constituição de maiorias parlamentares, que gerem a governabilidade. Agregue-se a possibilidade de recall nos distritos eleitorais, de forma a permitir uma constante renovação dos representantes, na hipótese de se afastarem daquilo que foi prometido ou de traírem a confiança dos seus eleitores.
É preciso ter coragem para conduzir as mudanças necessárias, circunstância que não dispensa o surgimento e a manifestação de lideranças nos mais diferentes cenários. Entre ficar no que se considera politicamente correto e combater as causas dos verdadeiros males que levam à paralisia institucional, deve-se optar pelo segundo caminho, descrevendo as coisas como realmente são. O que se sabe, é que o modelo atual está falido. Enquanto não se modificarem os sistemas de governo e eleitoral, o Brasil, no máximo, terá uma mudança de rostos na política, mas não de práticas e costumes.
BIOGRAFIA DO PALESTRANTE
Doutor em Direito do Estado pela UFRGS/ed. Ruprecht-Karls-Universität Heidelberg, Alemanha. Pesquisador convidado junto ao Europa Institut da Universidade de Saarland, Alemanha. Professor do programa de pós-graduação stricto sensu da Faculdade de Direito da UFRGS; Coordenador Acadêmico do Curso de Especialização em Direito do Estado da UFRGS. Professor da Escola da Magistratura Federal do Estado do Rio Grande do Sul - ESMAFE/RS; Professor de diversos cursos de Pós-graduação lato sensu da UFRGS, PUC/RS e AJURIS. Professor do Centro Universitário Ritter dos Reis e da Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre. Professor da Escola Superior de Advocacia da OAB/RS, onde exerce a função de coordenador dos cursos de capacitação em processo constitucional. Membro da Associação Luso-Alemã de Juristas: DLJV - Deutsch-Lusitanische Juristenvereinigung. Autor de Direito Privado e Constituição (RT, 2013), Curso de Direitos Fundamentais - teoria e prática (RT, 2014) e de diversos artigos na área do Direito Constitucional e direitos fundamentais.
Local: ALERGS - Sala da Convergência, andar térrreo
Dia: 10 de outubro - TERÇA FEIRA, 18:45 hs